Tradução de texto da revista PARIS MATCH (França), publicado originalmente em 3/12/2016 por Benjamin Locoge.
Desde junho passado, em Barcelona, o músico percorre o mundo com sua turnê. Nós o encontramos em Budapeste. Ele chega em Paris esta semana.
16 horas: O Budapest Sports Arena é um grande salão sem alma. A noite já começa a cair quando o ônibus de Jean-Michel Jarre estaciona perto dos camarins. Sem tempo a perder, a equipe técnica já está pronta: Jarre e seus dois músicos, Claude Samard e Christian Sauvage, sobem ao palco para duas horas de passagem de som.
17 horas: Para esta turnê, Jarre construiu sua própria cozinha. “Kitchen” é o nome dado à plataforma na qual ficam dispostos seus vários sintetizadores. Dois à sua frente, um à esquerda, uma enorme prateleira de vidro no lado direito, outros teclados antigos atrás. “Cada noite é um novo concerto”, ele diz. “Eu posso modular de acordo com minha vontade, tanto o volume do som quanto sua densidade. O importante é criar uma ligação com o público.” Para tanto, Jarre decidiu instalar também uma impressionante estrutura visual: três telas gigantes que se abrem e giram, permitindo projetar imagens 3D sem que os espectadores precisem usar óculos especiais. “Eles eliminam 60 % da luz, eu não queria uma bugiganga. Mas você verá hoje à noite.”
18h15: Os músicos e a equipe técnica fazem seus pratos no bufê. “Nós temos nosso chef particular”, conta Fiona Commins, assistente há muitos anos de Jarre, “que é esta vez da viagem. Isso nos permite manter alguns hábitos no meio desta loucura permanente que é a vida em turnê.” No seu camarim, praticamente desprovido de decoração, Jean-Michel confirma: “É um pouco como uma família na estrada. Finalmente eu tenho alguns momentos em que posso ficar a sós”. Na véspera, o mundo havia se espantado com a eleição de Trump. “Isso diz muito sobre o estado das nossas democracias… É preciso que nós prestemos atenção na França. Eu, que estou viajando muito, me dei conta que perdemos nossa atração. Paris, a elegância e o refinamento francês não são mais o sonho das pessoas. Os jovens preferem visitar Londres, BrExit or not, ou cidades como Xangai e Pequim…” Ainda assim, Jean-Michel se sente orgulhoso de ser um músico francês: “Sim, é importante pra mim. Especialmente por não termos muitos que atraem essas multidões, 12.000 pessoas em Lodz, o mesmo em Katowice, 9.000 ontem na Eslováquia, 10.000 esta noite …” Isto serve para calar os céticos.
19h15: Chris, seu manager da turnê, traz para ele uma salada de tomates e um prato de macarrão. “A ansiedade [ou medo] de subir no palco já vai começar, preciso dormir pelo menos 20 minutos antes de cada espetáculo.” Nós o deixamos em seu colchão improvisado, digno de pertencer a um acampamento militar. Alain, o engenheiro de som de todas as suas turnês, termina de jantar. “Estamos vivenciando coisas maravilhosas atualmente. O show é um grande sucesso, as duas noites na Polônia foram excepcionais, o concerto de Londres foi muito bom também.” Esta noite é o 24º concerto desde a volta em outubro. Vinte e seis são previstos ainda até dezembro.
20h20: Os 10.000 espectadores estão impacientes. Uma música ambiente já os deixou no clima. No lado dos camarins, o trio se prepara antes de serem conduzidos ao pé do palco por Chris e Fiona.
20h38: A sala finalmente silencia. Um cubo de telas, que vai aos poucos se abrindo, permite ver a estrela da noite com punhos para cima na “kitchen”. “ The Heart of Noise” começa o show vigorosamente : visualmente o espetáculo é de tirar o fôlego . Jarre te faz fluir por uma viagem hipnótica, dinâmica. À sua direita, Claude Simard [N.T. Samard] pula como sem parar atrás de sua bateria eletrônica, enquanto à esquerda o gauche Christian Sauvage faz um discreto trabalho de laboratório. A sala aplaude educadamente. “É assim quase sempre nos antigos país do Leste Europeu.”, Jarre nos explicou um pouco mais cedo, “Os últimos resquícios do comunismo, onde não se podia mostrar nenhuma forma de entusiasmo… ” É preciso esperar o primeiro hit da noite, Oxygène 2, para que os ânimos se aqueçam. Suficientemente vintage para ser reconhecida, a faixa passou por uma pequena remodelagem, um pouco mais dançante, mas permanecendo melancólica.
21h08: Edward Snowden está nas telas. JMJ pegou o microfone para apresentar “Exit”, a faixa em colaboração com o americano exilado. “É necessário mais pessoas como ele para evitar que um novo Donald Trump seja eleito em algum lugar do mundo”. Aplausos discretos e depois ovação ao final da música. Alguns minutos depois, Jarre executa uma impecável, old-fashioned “Souvenir of China”, tocada sobre um fundo de bandeiras vermelhas e amarelas. A sequência emocionante da noite. A partir daí o concerto tomará uma outra dimensão, mais leve e mais festiva. “Venha dançar na frente do palco”, ele convida o público em inglês. “E os senhores da segurança, sejam legais!” Os garotos abandonam as arquibancadas para vir dançar ao primeiro toque de “Brick England”, recente colaboração om o Pet Shop Boys, e também em “ Equinoxe 7” quase funky.
22h15: Depois de apresentar uma faixa inédita, “Oxygène 17” do seu próximo disco “Oxygène 3”, Jarre emociona a multidão: “Sei que vocês conhecem esta faixa, mesmo sendo censurada na época, pois ela os fazia livres em suas mentes. Espero que gostem.” Rendez-vous 4 fecha o show em uma atmosfera de festa generalizada . Ao pé do palco, Fiona e Chris parabenizam o músico, que pergunta: “Foi bom?”
23 horas: Frente a um prato de sushis e uma garrafa de saquê quente, Jarre conduz, como em todas as noites, um balanço do show com sua equipe. Tudo correu bem, com exceção de um problema de iluminação de sua plataforma durante uma música. O responsável de iluminação lhe explica a origem. Jarre não é do tipo que guarda rancor. “Depois de cinco anos em estúdio, faz bem pegar um pouco de ar. Passei mais tempo de minha vida sozinho fazendo música que em companhia de outras pessoas...” Dois noruegueses vêm lhe mostrar um projeto câmeras 360 graus. Jarre já considerou o caso. “Eu sei que alguns projetos muito complicadas não serão feitos. Eu gosto quando as coisas avançam”. Um encontro é entretanto marcado para um grande teste ao vivo em Amsterdam daqui a duas semanas.
0h15: Os ônibus estão prontos. Jarre tem mil idéias na cabeça, muita coisa para conseguir dormir na sua casa sobre rodas. “Eu consigo dormir em qualquer lugar, mas pouco”, ele diz com seu computador à mão. Nove horas de estrada lhe esperam até Cluj-Napoca na Romênia. “Enfim uma cidade onde nunca toquei.” Com 68 anos, Jarre não ama nada mais que o desconhecido. Isto é gratificante.
“Oxygène”, volume 3
O pioneiro da [música] eletrônica francesa ama os aniversários. Quarenta anos depois de “Oxygène”, Jarre se perguntou como celebrar a data. “Decidi me fechar cinco semanas em estúdio, exatamente como fiz na época, e ver o que saía.” Em menos de quarenta minutos, Jarre conseguiu encontrar os sons que fizeram o triunfo do disco original, enquanto se move em uma direção mais groove, um pouco mais moderna. O terceiro volume – formado por duas partes, uma primeira mais sombria e uma segunda parte mais dançante e luminosa – é um verdadeiro presente para seus fãs fiéis. E é também uma forma de lembrar ao mundo eletrônico quem é que manda. B.L.
“Oxgyène 3” (sic) (Sony Music), lançado em 2 de dezembro (de 2016). Com audição dia 12/12/2016 em Paris (AccorHotels Arena).
Agradecimento: Raphael Barbosa (Tradução)
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