Jean-Michel Jarre sempre demonstrou o seu desejo de incentivar a comunidade local a participar de seus concertos. Por isso, o coral é sempre escolhido na região onde ocorre o espetáculo. Aqui está o relato de Chris Mooney, um dos integrantes do coral do lendário concerto Rendez-Vous Houston que completa 35 anos neste dia 5 de abril:
“Fui cantor por toda a minha vida e sempre fui fascinado por computadores e raios laser. Portanto, não deveria ser surpresa a minha participação no coral que foi escolhido para se apresentar no ‘Rendez-Vous Houston – A City in Concert’.
‘The Singing Boys of Houston’ foi o primeiro coral masculino da cidade. Consistia de garotos com idades entre nove e quatorze anos e realizava audições duas vezes por ano para novos membros. Com ensaios semanais e workshops ocasionais aos sábados, sempre estávamos ocupados cumprindo nossa agenda de apresentações, muitas vezes bastante rigorosa. Durante o mês de dezembro, fazíamos cerca de trinta shows por toda a cidade.
Existem dois corais: um preparatório para novos membros e um outro destinado a realizar turnês, composto por meninos que passaram pelo menos um ano no coral preparatório, para só depois, passarem para uma segunda audição. O coral de concertos percorre cidades como Nova York, Atlanta e Washington, e também fizemos apresentações em outros países, como na Polônia, Áustria e (naquela época) Alemanha Ocidental. Após a movimentada temporada de Natal, os eventos diminuíam e a gente tinha um período de calmaria até o final de abril, com o concerto da primavera e a turnê de verão.
Porém, durante a última semana de março de 1986, recebemos uma ligação perguntando se estaríamos disponíveis para ensaios durante todos os dias da semana seguinte e depois para um concerto no próximo sábado. Não sabíamos dos detalhes do evento até que na segunda-feira, na hora do ensaio, Gary Patterson, nosso Diretor Musical, entrou na sala, apagou todas as luzes e começou a tocar as faixas ‘Rendez-Vous 2’ e ‘Rendez-Vous 4’.
Quando ele acendeu as luzes, percebeu pelos olhares de todos nós que estávamos muito animados em cantar essas músicas. Recebemos então as partituras escritas à mão para praticarmos, e uma fita com as músicas para cantarmos juntos. Nem é preciso dizer que arrastei meu pai diretamente para a loja de discos naquela noite, para comprar este ótimo álbum. Eu fui então fisgado pela música de Jean-Michel Jarre.”
“Durante alguns dias, acompanhamos as manchetes nos noticiários da TV e nos jornais, bem como cartazes sendo veiculados por toda a cidade. Felizmente, consegui colocar as mãos na maioria dos artigos, bem como em alguns pôsteres. Ensaiamos sozinhos e com os meninos da ‘High School for the Performing and Visual Arts’.
Ambos os grupos tiveram uma sessão com Sylvain Durand durante a semana para garantir que estávamos criando o som que Jarre estava procurando. Ele nos disse que Jarre queria algo do espaço sideral para o som. Depois de cerca de meia hora, ele estava satisfeito com o que tínhamos produzido. Sylvain então nos mostrou os trajes que usaríamos em alguns dias, e todos tentamos obter o ajuste certo. Nesse ponto, estávamos todos realmente animados com o show e mal podíamos segurar o entusiasmo que sentíamos na escola nos dias seguintes.”
“Em uma noite, descobri que Jarre estaria dando autógrafos na Foley’s (uma rede de lojas de departamento) no dia seguinte. Como minha mãe estava trabalhando no downtown na época, implorei a ela que passasse a hora do almoço na fila com a capa da minha fita cassete na mão, tentando um autógrafo. Ela puxou conversa com um homem que estava na fila atrás dela. Quando ela teve que sair para voltar ao trabalho, ele disse que pegaria o autógrafo e ligaria para ela mais tarde.
Naquela noite, recebi meu autógrafo com a inscrição ‘Thanks, Chris’. Esta foi, com certeza, minha lembrança mais preciosa do show. Minha única tristeza é que ele foi roubado alguns anos depois (nossa casa foi assaltada), junto com uma impressão brilhante do skyline autografado por uma caneta glitter pelo Jarre.
Então veio a sexta-feira, um dia antes do show. O dia do grande ensaio geral e os garotos estavam animados. Finalmente conseguimos ver todo o equipamento que seria usado durante o show e, claro, conhecemos o próprio mestre. Não conversamos com ele individualmente, mas conversamos alguns minutos antes e após o ensaio.
Sabíamos que o som seria enorme, mas ninguém do coral tinha a menor ideia do quão alto seria. A mãe de um dos garotos estava no estacionamento em frente ao palco durante o ensaio e, segundo consta, ela teve que ser levada ao hospital por causa do efeito da bateria em seu coração.”
“Foi pedido para ficarmos em silêncio na hora em que não estivéssemos cantando, por causa da precisão com que os microfones captavam nossas vozes. Tínhamos apenas alguns microfones, mas um sussurro podia ser ouvido no fundo do estacionamento, que ficava em frente ao palco. Os técnicos disseram a todos nós que, na noite do show, nossos sussurros poderiam ser ouvidos no viaduto da freeway atrás do Buffalo Bayou que atravessa o Tranquillity Park. À medida que escurecia naquela noite, tivemos a chance de ver todos os efeitos de iluminação, mas naturalmente, sem os fogos de artifício. Foi o único ensaio a que assisti que gostaria que durasse mais, mas infelizmente tudo acabou rápido.
Então veio o sábado, 5 de abril de 1986, e eu mal conseguia segurar a empolgação esperando pelo show. Por volta das cinco da tarde, os dois corais se encontraram na escola. Embarcamos nos ônibus escolares e fomos para o local. Não tínhamos ideia de onde a gente ficaria durante as partes do show em que não estaríamos cantando, então ficamos compreensivelmente desapontados quando fomos levados para o saguão de um edifício sem vista para o palco ou para o skyline. Tudo o que podíamos ver ou ouvir eram os fogos de artifício acima de nós, que naturalmente aumentavam nossa expectativa e nossa adrenalina.”
“Finalmente chegou a hora! Saímos do prédio e literalmente tivemos que descer a rua com nossas roupas brancas para chegar nas escadas que levavam ao palco. Esperamos alguns minutos atrás das miniaturas do skyline e então, chegou a hora de nos apresentarmos!
A primeira música foi ‘Rendez-Vous 3’. Mesmo sem cantar uma nota sequer, estávamos ansiosos por ela. A Harpa Laser surpreendeu a todos nós com seus raios verdes disparando para o céu noturno. Talvez o melhor aspecto da harpa, foi a observação dos feixes sendo empinados para o alto, em direção às nuvens.
Então veio a primeira música que cantamos: ‘Rendez-Vous 2’. Foi a peça mais difícil de executar, já que fomos divididos em cinco partes de vozes. Foi muito difícil ouvir nós mesmos como um todo com todos os outros sons altos da música e dos fogos de artifício. O outro aspecto difícil de atuar na música foi tentar prestar atenção ao Diretor Musical, com todas as luzes e efeitos visuais dos fogos de artifício explodindo ao nosso redor. Jean-Michel comentou mais tarde que, considerando a nossa faixa etária, éramos o grupo mais profissional para a nossa idade com quem ele já havia trabalhado.
Ao final de ‘Rendez-Vous 2’, nós voltamos silenciosamente para o backstage enquanto Jean-Michel tocava ‘Oxygene 5’. Após essa música, Jarre anunciou que Kirk Whalum tocaria saxofone para ‘Last Rendez-Vous’ no lugar de seu bom amigo, o astronauta Ron McNair.
Todos os envolvidos previram que este seria um momento emocionante, mas ninguém poderia imaginar o quão emocionante foi. Quando o batimento cardíaco começou, nenhum braço na multidão estava sem arrepios. Foi a primeira vez em toda a noite que a multidão ficou quieta. Junto com o silêncio veio um vento frio sobre o público e parecia que embora Ron não estivesse conosco pessoalmente, ele estava com certeza em espírito. Não foi possível ver Kirk de onde estávamos no backstage, mas o único holofote que o iluminava parou na parede do Méridien Hotel atrás do palco. Dentro do local, podíamos ver a silhueta de Kirk, e por um momento pensei que Ron havia se juntado a nós para uma última música.
Imediatamente após ‘Last Rendez-Vous’, voltamos ao palco para cantarmos em ‘Rendez-vous 4’, que foi uma emoção absoluta. Como essa foi a faixa constantemente tocada pelas rádios da cidade antes do show, uma grande parte da multidão instantaneamente a reconheceu e realmente aplaudiu o tempo todo.
Jarre então recuou para o backstage e voltou depois de alguns minutos, vestindo uma roupa de cowboy branca, com uma jaqueta cravejada e chapéu. Depois de apresentar os músicos um por um, ele iniciou os primeiros compassos do bis, novamente com ‘Rendez-Vous 4’. Jean-Michel realmente parecia ser um menino e se divertiu muito. Naturalmente, sua empolgação se espalhou instantaneamente para o resto dos músicos no palco e para a multidão que começou a aplaudir e a gritar a cada batida. Meu nível de adrenalina só aumentava com cada nota tocada, e não diminuiu nem mesmo após a batida final da bateria e do último estrondo e clarão dos fogos de artifício acima de nós.”
“Foi realmente uma noite que nunca esquecerei e que ainda sonho em ter a chance de fazer tudo de novo. Certamente me tornei um fã eterno de sua música. Obrigado Jean-Michel pela melhor noite da minha vida!!!”
Chris Mooney
Fonte: Revolution – Jean-Michel Jarre Magazine | Issue 8 – Maio 1996
Para mais informações sobre “The Singing Boys of Houston” (atualmente denominado “Houston Boychoir”), visite: Site oficial|Facebook|Twitter|Instagram|YouTube.
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