No último dia 4 de outubro, o Brasil perdeu um dos grandes nomes da música brasileira. O jornalista, crítico, produtor, compositor e também músico, José Eduardo Homem de Mello, mas que era conhecido por todos como Zuza Homem de Mello, falecido aos 87 anos em S.Paulo, capital. Segundo nota da família, ele faleceu de infarto, enquanto dormia.
Nascido na capital paulistana em 20 de setembro de 1933, desde cedo, Zuza se mostrou interessado em música. Atuou como baixista profissional em bailes e clubes da cidade. Em 1955, incentivado pela mãe, abandonou o curso de engenharia para dedicar-se à música. No ano seguinte, iniciou no jornalismo e assinou colunas de jazz para os jornais paulistanos Folha da Noite e Folha da Manhã. Em 1957, passa a frequentar a School of Jazz, em Tanglewood (EUA) onde teve aulas com Ray Brown e outros músicos. Em 1957-58, estuda musicologia na Juilliard School of Music, de Nova York.
A partir de 1958 passou a realizar palestras e cursos sobre Música Popular Brasileira e Jazz no Brasil e no exterior, tendo sido também jurado de alguns do mais importantes festivais de música no Brasil. De volta ao Brasil em 1959, Zuza — como ficou conhecido no meio musical — ingressou na TV Record, onde permaneceu por cerca de dez anos. Ao longo desse período, trabalhou como engenheiro de som nos programas de MPB e festivais da emissora, e booker na contratação de astros internacionais.
Entre 1977 e 1988, concentrou suas atividades no rádio e na imprensa, produzindo e apresentando o “Programa do Zuza”, na Rádio Jovem Pan AM. Trabalhou também como crítico de música popular no jornal O Estado de S. Paulo e escreveu para as revistas SomTrês, Nova e outras publicações no Brasil e no exterior. Em 1997, coordenou a Enciclopédia da Música Brasileira, e em 1982, ao lado de Tárik de Souza, planejou e coordenou a terceira edição da coleção didática História da Música Popular Brasileira, da Editora Abril.
Entre os músicos nacionais que ajudou a produzir estão: Elis Regina, João Bosco, Ivan Lins e Alcione, entre outros. Nos anos 80, dirigiu os três Festivais de Verão do Guarujá, reunindo os veteranos Jackson do Pandeiro, Patativa do Assaré, Luiz Gonzaga, Jorge Ben Jor, Raul Seixas, e os ainda novatos Djavan, Beto Guedes e Alceu Valença. Entre os grandes nomes, também destacam sua produção para Milton Nascimento, Gilberto Gil, Chico César, Lenine, Sérgio Santos e Zélia Duncan. É uma lista quase infinita de artistas. Produzia discos, produzia espetáculos, produzia musicais…
Jornalista convidado para os mais importantes festivais mundiais de música — Montreux, Edimburgo, Nova York, New Orleans, Barbados, Paris, Midem de Cannes, Tóquio, Montreal e Perugia — Zuza integrou a equipe dos dois Festivais de Jazz de São Paulo (1978 e 1980) e foi curador do elenco do Free Jazz Festival, desde a sua primeira edição, em 1985, e depois do seu sucessor, o Tim Festival. Foi membro e ex-presidente da Associação dos Pesquisadores da MPB.
Ele conhecia a música e suas vertentes, seja o jazz, a bossa nova, o samba…a música popular, e até o rock. Era tão antenado que também tinha grande paixão pela música eletrônica e conhecia bem vários pioneiros da area.
Só pra se ter uma ideia, em 1998, quando foi curador do Free Jazz Festival, foi ele quem trouxe pela primeira vez ao Brasil, a banda alemã Kraftwerk, pioneiros da música eletrônica, em dois shows superconcorridos que aconteceram no Jockey Club de S.Paulo e no MAM no Rio de Janeiro. Vários membros do Jarrefan-Brazil estiveram neste show e só podemos dizer, que foi fantástico. Zuza introduziu o show com suas próprias palavras (eles ainda levavam o estúdio Kling Klang juntos): “Sejam bem vindos ao Free Jazz Festival, e fiquem agora com os robóticos do Kraftwerk…”. O show foi um grande sucesso e eles retornaram ao nosso país para o Tim Festival de 2004, novamente com a curadoria de Zuza e finalmente, uma última vez em 2008, no Just a Fest abrindo para o Radiohead.
Um homem com muita visão musical, também gostava e admirava Jean-Michel Jarre. Não foi à toa que o apresentador João Doria Jr. (atual Governador do Estado de S.Paulo, e que entrevistou Jean-Michel Jarre em 1991, para o Programa Sucesso, na TV Bandeirantes) convidou Zuza para apresentar Jarre ao público brasileiro no programa, conforme pode ser visto no vídeo abaixo. Zuza deu uma brilhante declaração sobre o músico francês com grande elegância e inteligência, dizendo que Jean-Michel, era filho do compositor Maurice Jarre e havia sido aluno de Pierre Schaeffer:
Nós do Jarrefan-Brazil, também lamentamos bastante o falecimento de Zuza, e nós temos uma história bonita com ele que gostariamos de compartilhar com os fãs. Em 2004, seria o aniversário de 450 anos da cidade de S.Paulo, e nos mobilizamos pra tentar convencer a prefeitura da cidade a fazer um mega-concerto nos moldes de Houston, La Défense ou Moscou na capital paulista. Ficou acertado entre os membros do Jarrefan-Brazil, que seria elaborado um projeto e tentaríamos entregar na Prefeitura que estava aberta a ideias para o aniversário da cidade. Foi quando o então co-fundador, Ricardo Melo, descobriu que o Zuza Homem de Mello, iria fazer uma palestra na famosa escola de música EM&T – Escola de Música e Tecnologia (fundada pelo ex-guitarrista do 14 Bis, Wander Taffo), perto de sua casa. Ricardo Melo, mesmo não sendo músico conseguiu entrar na palestra e assistir a mesma. Ele levou uma pasta com toda a documentação que seria entregue na Prefeitura. Ao final da palestra, houve então a abordagem e os dois conversaram rapidamente. Ao final, Ricardo passou a documentação para Zuza, com um pedido para dar uma assessoria ao projeto, já que éramos totalmente amadores, ou se ele poderia passar para uma grande produtora. Zuza aceitou o nosso material…mas Ricardo Melo não imaginava que ele iria responder. Quase duas semanas depois veio a surpresa. Melo recebeu um e-mail do próprio Zuza, informando que o projeto era muito interessante, mas que para chamar a atenção da Prefeitura, era preciso de uma formatação melhorada, como informar custos, informar como o projeto seria feito e quem iria fazer, despesas de viagem, hospedagem etc.
Mesmo com este suporte técnico do Zuza, refizemos o projeto e enviamos a prefeitura de S.Paulo, na gestão da Prefeita Marta Suplicy. O resultado foi um pequeno apoio ao nosso projeto, pois o Secretário da Cultura pediu para o Jarrefan-Brazil assumir todos os riscos ou tentar contactar uma produtora responsável para fazer o projeto acontecer. Infelizmente, nenhuma produtora se interessou, pois já tinham seus próprios projetos e infelizmente, foi mais uma tentativa morta de trazer Jean-Michel Jarre ao Brasil. Mesmo assim, Zuza Homem de Mello, nos deu seu apoio e dicas para seguirmos em frente e por isto, seremos eternamente gratos a ele.
Obrigado Zuza!!!
Texto: Ricardo Melo | Fontes: G1 e Folha de S.Paulo
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